Madassa não sabia ler nem escrever.
Madassa tinha a idade que as crianças têm quando sabem ler e escrever.
Mas Madassa não sabia ler nem escrever.
Dentro da cabeça de Madassa não havia lugar para palavras.
Dentro da cabeça de Madassa havia um medo todo negro, com os sons da guerra e dos mortos, muitos mortos.
Na cabeça de Madassa havia uma raiva vermelha cheia de «porquê? porquê?» como garras que espetam.
Dentro da cabeça de Madassa havia uma névoa de tristeza, tão espessa que ele não conseguia lembrar-se da cara do seu irmão ou da sua irmã, que tinham desaparecido e ninguém sabia onde.
Alguns dias, na cabeça de Madassa estava a fome que lhe enchia o ventre.
O negro do medo, as garras da raiva, a névoa da tristeza – e, alguns dias, a fome – ocupavam todo o espaço na cabeça de Madassa.
Não havia espaço para as palavras.
A professora já não sabia o que fazer para ajudar Madassa. Quanto ela tinha tempo, lia-lhe histórias que ele não conseguia ler sozinho.
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A história do Pequeno Polegar, que estava tão assustado na floresta – e o medo do Pequeno Polegar passeava na cabeça de Madassa.
A história do Grand Crieur , que estava sempre zangado – e a raiva do Grand Crieur era igual à raiva na cabeça de Madassa.
A história d’A Pequena Vendedora de Fósforos – e a tristeza da pequena vendedora gritava na cabeça de Madassa.
A professora contava-lhe também a história de Pierrot-la-Lune que queria florescer a terra inteira com as plumas dos pássaros – e as penas dançaram na cabeça de Madassa.
Na cabeça de Madassa, o medo do Pequeno Polegar deixava palavras para dizer medo.
A cólera de Grand Crieur deixava palavras para dizer cólera.
A tristeza de A Pequena Vendedora de Fósforos deixava palavras para exprimir a tristeza.
A dança das palavras de Pierrot-la-Lune deixava palavras que davam vontade de dançar.
Uma manhã, as palavras que se agitavam rapidamente na cabeça de Madassa não quiseram mais ficar lá. Madassa pegou um caderno, uma caneta, e um pouco desajeitadamente, como uma criança que aprende a andar, escreveu:
Madassa medo
Madassa cólera
Madassa tristeza
Madassa nas ervas
Madassa ao vento
Madassa na água
Madassa cinzento preto azul
Madassa vermelho amarelo preto
Madassa cinzento amarelo verde
Madassa galo tigre
Madassa sol
─ Um poema! ─ disse a professora. ─ Tu escreveste um poema!
Então foi isso, escrever!
Pegar nas palavras das histórias para fazer as palavras de Madassa.
É preciso ler muitas histórias para ter muitas palavras.
Madassa começou a ler. E a escrever também.
Quanto mais ele lia, mais escrevia.
Quanto mais escrevia, mais ele queria ler.
Era um carrossel sem fim.
Madassa que não sabia ler nem escrever, agora enchia cadernos e mais cadernos.
Um dia talvez, ele escreveria um livro.
Madassa escritor.
Do livro Madassa de Michel Séonnet traduzido por Parentalidade Digital.
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